Familiarize-se
com as várias formas de expor a Palavra de Deus a fim de que a mensagem chegue
clara aos corações e mentes
Certa ocasião, li a história de um
pastor inteligente e hábil para falar. Mas, pastoreando uma igreja composta de
pessoas simples, achava que não era necessário preparar sermões. Em busca de
permissão divina para acalmar a consciência, prometeu a Deus que pregaria de
improviso a fim de que o Espírito Santo o guiasse. Tudo ia bem até que, certo dia,
minutos antes de começar a pregar, foi surpreendido pela chegada de um dos seus
líderes denominacionais. Envergonhado, compreendeu que, mesmo tendo conseguido
iludir a igreja com os sermões que pregava, não conseguiria fazer o mesmo com o
chefe. Cumprimentando-o, tratou de explicar o voto que tinha feito a Deus.
Aparentemente, o líder entendeu, mas, na metade do sermão, se retirou. Ao terminar
o culto, o pastor encontrou um bilhete na sala pastoral, com os seguintes
dizeres: “Eu o absolvo de seu voto.”1
Essa história mostra que aquele
pregador não tinha compreendido o privilégio e a responsabilidade implícitos na
tarefa de pregar a Palavra. É extraordinário o fato de que Deus decidiu usar
homens falhos como Seus porta-vozes, para salvar o mundo “pela loucura da
pregação” (1Co 1:21). Isso indica que, na dinâmica da pregação, estão conjugados
dois aspectos: o divino e o humano. No aspecto divino, Deus age com Sua
Palavra, tocando corações e transformando vidas, pelo poder do Espírito Santo.
Porém,
Ele também considera importante o
aspecto humano, a julgar pelo que Paulo escreveu a Timóteo: “Procura apresentar-te
a Deus aprovado, como obreiro... que maneja bem a Palavra da verdade” (2Tm
2:15).
Nesse texto, o termo “procura” é
derivado do imperativo grego spoudason, cujo significado é “fazer o
melhor possível, não economizar esforços, trabalhar arduamente”.2 O referido
termo está acompanhado do reflexivo seauton (tu mesmo), com o propósito
de enfatizar o agente da ação. Assim, podemos parafrasear a declaração paulina
nos seguintes termos: “Faça tudo o que depender de você para se apresentar como
obreiro aprovado... que maneja bem a Palavra da verdade.” Em outras palavras, Deus
espera que a pessoa que maneja Sua Palavra assuma com responsabilidade essa
função, fazendo sua parte da melhor forma possível e deixando com Ele os
resultados.
Considerando que estamos falando sobre
a importância do aspecto humano, compartilharemos aqui algumas ideias sobre os
tipos de sermão, a fim de organizar melhor os temas que expomos a partir da Palavra
de Deus.
Dedutivos e indutivos
Os sermões podem ser classificados em
diversos tipos. E Deus tem usado esses diferentes tipos de sermões para
alcançar classes distintas de pessoas em diversas circunstâncias. John Sttot
tinha razão quando afirmou que “diferentes textos e temas exigem tratamento
diferente. Devemos cultivar a diversidade e procurar nos libertar de um só
estereótipo”.3
Podemos nos familiarizar com diferentes
tipos de sermão, a fim de estarmos em condições de expor a Bíblia a partir de
óticas diferentes, ajustando cada tipo a uma situação específica e pertinente.
Contudo, sempre será imprescindível que nos asseguremos de que nosso sermão
está fundamentado na Bíblia que fala à mente e ao coração. Também devemos estar
seguros de apresentá-lo em frases curtas e diretas, exaltando Cristo como a
única esperança do pecador.4
Na elaboração de sermões, podemos considerar
dois grandes eixos: de movimento e de conteúdo.5 Em um sermão, movimento indica
a maneira pela qual o tema é introduzido e desenvolvido. Dentro desse eixo, os
sermões podem ser indutivos ou dedutivos.6
No sermão dedutivo, a ideia
principal aparece no início, ou seja, no fim da introdução. A partir daí, será
desenvolvida cada ideia que aparece na apresentação inicial. Por exemplo, se o
tema a ser tratado é a fidelidade, no fim da introdução, pode ser dito algo
como: “Hoje, veremos que os crentes fiéis avançam pela fé, aprendem a depender do
Senhor, cada dia, e obedecem por amor.” Então, segue-se a análise de cada uma
dessas ideias em uma estrutura lógica e sistemática. É como se, numa viagem,
alguém nos informasse que, para chegar ao destino, passaremos antes por outros
lugares.
Essa classe de sermão tem a
vantagem de ter direção e clareza. Porém, pelo fato de estabelecer todas as ideias
já no início, se o pregador não estiver bem preparado ou não pregar com
convicção, a mensagem soará monótona e enfadonha, porque as pessoas já sabem
sobre o que ouvirão.
No modelo indutivo, a ideia central
somente aparece no fim do sermão; porém, inicia-se apresentando interrogações
que exigem respostas ao longo do tema. Como exemplo de introdução indutiva,
podemos dizer o seguinte: “Podem realmente os crentes ser fiéis? Que aspectos bíblicos
implica a fidelidade? Que deve o crente fazer para ser fiel?” Evidentemente, o
sermão se desenvolverá respondendo cada pergunta. A grande vantagem desse tipo
de sermão é o elemento surpresa que se mantém ao longo da exposição, convertendo-o
em uma viagem de exploração e descobertas, conduzindo a um clímax. Porém, se o
tema for muito conhecido da congregação, sua utilização talvez não seja muito
recomendável porque, a menos que lhe sejam adicionados novos elementos, também
pode se tornar monótono
Expositivo e textual
O conteúdo do sermão se refere ao
critério escolhido para lhe dar forma ou estrutura. Nesse contexto, o sermão
pode ser expositivo, temático, narrativo e biográfico. Os dois eixos podem se
conjugar e formar, por exemplo, sermões expositivos dedutivos ou temáticos
indutivos.
Anteriormente, era feita diferença entre
sermão expositivo e sermão textual, com base na quantidade de versos em que
estava fundamentado. Se houvesse um ou dois versos, o sermão era textual. Maior
quantidade de versos o caracterizava como expositivo. Porém, essa divisão não é
muito satisfatória. Todo sermão
em que uma porção da Bíblia é exposta,
mantendo-se fiel à forma e ao contexto,7 é expositivo, embora a exposição possa
adotar várias dimensões: um verso, uma seção, um capítulo ou livro.
A grande força desse tipo de sermão
é que ele permite conhecer o texto bíblico em toda a sua riqueza. Exige que a
passagem seja estudada minuciosamente, considerando a estrutura do texto, os
contextos literário, cultural e geográfico. Permite compreender o texto como
foi entendido pelos leitores originais e, a partir dessa compreensão, extrair
lições para hoje. Em semanas de oração ou em séries, podem ser estudados
capítulos de um livro escolhido. A riqueza do texto bíblico é tão imensa que
muitas lições podem ser extraídas.
Considerando que a elaboração desse
tipo de sermão exige muita dedicação e estudo, existe o risco de que acabe não
sendo bem preparado e, em vez de expor a Palavra, o pregador acabe torcendo o
texto, dizendo qualquer coisa à congregação.
Narrativo
O sermão narrativo é caracterizado por
expor a mensagem por meio da narração vivencial, como quando uma história é
contada. Esse tipo deve ser composto levando em consideração os elementos
componentes de uma história: (1) cenário: personagens e problema; (2) enredo:
desenvolvimento da ação; (3) ponto culminante: clímax da ação; e (4) desfecho:
solução do problema, fim da tensão.8
Ao expor esse sermão, devemos envolver
o máximo possível de sentidos, e ser tão descritivos que possamos nos
transportar com a audiência ao lugar dos fatos. Por exemplo: “Pode você ouvir o
gemido dos doentes à beira do tanque Betesda esperando para entrar nele?”
“Sente o vento frio movendo suas vestes junto à cruz no Gólgota, na tarde da
crucifixão?” “Pode contemplar assombrado as águas do Mar Vermelho se abrindo?”
Esse tipo de sermão pode ser
impactante e inesquecível. É perfeito para manter a atenção e fazer as pessoas
vibrarem.9 Contudo, exige que o pregador conheça bem a
história e seu contexto, para evitar anacronismos,
como quando alguém (pensando em Noé) disse que Moisés fez a arca. Também
precisamos ficar atentos para não perder de vista o objetivo do tema. É muito
fácil terminar contando uma história bonita e divertida, mas incapaz de levar
os ouvintes a entender os aspectos fundamentais do evangelho.
Temático
Nesse modelo, escolhemos um tema e
o desenvolvemos a partir da perspectiva bíblico-teológica. Esse tipo permite
abordar, em sequência organizada e sistemática, as diferentes ideias que a
Bíblia apresenta sobre qualquer assunto. Podemos analisar questões doutrinais,
como justificação pela fé, a predestinação, ou temas contemporâneos que
requerem resposta ético-cristã, como aborto, sexualidade, divórcio e outros.
A maior vantagem desse tipo de sermão
é que podemos apresentar posições claras e consistentes. Mas, seu grande perigo
é que cheguemos a atrelar em um tema textos bíblicos que não se relacionem,
caindo no uso inadequado do “texto prova”. Por isso, há quem tenha receio do
sermão temático e prefira não usá-lo. Entretanto, devemos nos lembrar de que
Jesus usou esse modelo, quando “começando por Moisés, discorrendo por todos os
profetas, expunha-lhes o que a Seu respeito constava em todas as Escrituras” (Lc
24:27). Cristo citou diversos textos ao longo das Escrituras, para mostrar como
haviam se cumprido nEle. Isso indica que, enquanto os textos usados estiverem
em harmonia com o contexto e uns com os outros, o uso do “texto prova” é
legítimo.
Biográfico
O sermão biográfico tem como base a
vida de algum personagem bíblico e vale-se de seus aspectos positivos para
extrair lições para a vida dos ouvintes. Por sua própria natureza, é evidente
que partilha elementos próprios dos sermões expositivos, temáticos ou
narrativos. Porém, a ênfase sempre será alguma das etapas da vida do personagem
e as lições dali extraídas, como o antes e o depois de sua conversão, seus
fracassos e vitórias. Para que isso seja representado vividamente, devemos nos
familiarizar com o contexto daquela vida, seu entorno geográfico e cultural.
Dependendo do tipo de matizes narrativos
que agreguemos, podemos conseguir uma rápida identificação do homem moderno com
as experiências da vida dos personagens bíblicos. Estes, assim como nós,
enfrentaram lutas e vitórias. Ao mostrar como Deus os usou e perdoou, apesar de
suas debilidades, fica claro que Ele também pode fazer o mesmo com as pessoas
do século 21.
Tem-se dito que esses sermões “frequentemente
perdem força quando o pregador sobrecarrega a pregação narrativa com longas
explicações e conclusões forçadas”.10 Insistir muito nos aspectos negativos e
nos erros dos personagens é uma forma errada de pregar um sermão biográfico. É verdade
que o sermão deve mostrar a realidade do grande conflito. Porém, sobretudo,
deve ressaltar que a mesma graça divina que operou na vida do personagem
escolhido pode fazê-lo em nossa vida por meio de Jesus Cristo.
Como vimos, há várias formas de expor
a Palavra de Deus, para que a mensagem chegue aos corações e mentes com clareza
e profundidade. A escolha de uma dessas formas depende de lugares e
circunstâncias. Porém, estando no escritório pensando no que vai dizer à
igreja, Lembre-se disto: Você não tem à disposição somente as ferramentas da
homilética e da oratória, mas também os recursos inesgotáveis do Espírito
Santo. Peça que Ele o guie, confie nEle e faça sua parte. Deus quer falar ao
Seu povo através da Escritura e deseja usar você como Seu instrumento (2Tm
4:1-5).
Referências:
1 John R. W. Sttot, A Pregação:
Pontes Entre Dois
Mundos (Grand Rapids, MI:
Libros Desafios,
2000), p. 205, 206.
2 Barclay M. Newman Jr., A Concise Greek-
English Dictionary of the New Testament, ver
Bible Works for Windows, 7.0, 2006.
3 John Sttot, Op. Cit.,
p. 225.
4 Ellen G. White, Obreiros
Evangélicos, p. 158,
159, 177, 162.
5 Ronald J. Allen, ed., Patterns of Preaching: A
Sermon Sampler (St. Louis, Missouri:
Chalice
Press, 1998).
6 Ibid.
7 Pablo A. Jiménez, Princípios de
Predicación
(Nashville: Abingdon Press, 2003), p. 87.
8 Scott M. Gobson, ed., Preaching the Old
Testament (Grand Rapids, MI:
Bakerbooks,
2006), p. 76.
9 Bryan Chapell, Como Usar
Ilustraciones Para
Predicar con Poder (Grand Rapids, MI:
Editorial
Portavoz, 2007), p. 59.
10 Ross W. Hayslip, Predicar Sobre
Personajes Bíblicos, ver HYPERLINK
“http://www.desarrollocristiano.
com/articulo,php?id=2280&c=23”
http://www.desarrollocristiano.com/
articulo,php?id=2280&c=23 4/02/11.
Autor: Cristhian
Alvarez Zaldúa - Diretor
do Seminário Adventista de Teologia do Equador
Fonte: Revista Ministério
– Maio/Junho 2011 – págs.27-29
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