Introdução
De minha modesta perspectiva, um dos assuntos mais fascinantes das
Santas Escrituras diz respeito aos dons espirituais.
Primeiramente porque é ali que Deus manifesta de forma esplêndida suas
mais excelentes virtudes. Três delas são inerentes à Sua pessoa e exclusivas:
onipotência, onisciência e onipresença; outras, Ele nos convida a compartilhar:
amor, bondade, compassividade, perdão, misericórdia, longanimidade, enfim, a
graça torna-se visível em sua forma mais pura, mais santa, mais divina.
Inquestionavelmente, em matéria de dons espirituais, o apóstolo Paulo é
um expert. Ninguém em toda Escritura
falou com tanta propriedade sobre este tema como ele. As passagens clássicas
encontram-se nos capítulos 12 e 14 de I° Coríntios.
Segundo, é que somente pela graça se pode explicar como um Deus com
tantas virtudes concede a cada um de nós, que somos falhos, finitos, limitados
e pecadores, poder, capacidade através de talentos e habilidades para serem
usados exclusivamente para a edificação do corpo de Cristo - Sua igreja.
Para reflexão
Já que a concessão de dons espirituais é de tamanha relevância, pois tem
a ver com o crescimento espiritual – santificação, com o cumprimento da missão
que o Senhor nos confiou; com a salvação, porque alguns enterram, deixam apagar
ou mesmo morrer o dom que graciosamente receberam de Deus?
O texto chave faz parte da última obra de Paulo. Dirigida a Timóteo, seu
filho na fé e a nós extensivamente; nela Paulo manifesta esta preocupação.
Objetivo da mensagem
Primeiro, mostrar que tão importante quanto ser agraciado com um dom é
mantê-lo vivo. Segundo, aprender por contraste como conservá-lo.
O que estava acontecendo com
Timóteo?
A Bíblia não entra em detalhes, mas que Paulo estava preocupado, ah estava.
“Não bebas
mais água só, mas usa de um pouco de vinho, por causa do teu estômago e das
tuas frequentes enfermidades” (1 Timóteo 5:23). Através dos olhos da fé somos levados a
acreditar que o seu problema físico estava começando a comprometer sua saúde
espiritual. De sua perspectiva, Timóteo carecia reavivar o dom que havia
recebido de Deus.
Dom que procede de Deus não deve ser apagado. Entretanto, por alguma
razão que nos é desconhecida, Timóteo estava se esquecendo de que o Espírito
Santo habitava nele (vers. 14). O dom de Deus, simbolicamente transmitido pela
imposição das mãos, estava sendo esquecido.
Como nos esquecemos do primeiro amor! Porque que isto acontece conosco? Os motivos são os mais diversos. Cada um de
nós tem os seus. Porque foi acontecer com Timóteo?
Não sabemos. Talvez o fato de ter sua saúde fragilizada (dores de
estômago) e não conseguir a desejada cura o tenha feito desanimar, cansado de
viver. Talvez tenha orado a Deus e como Deus não tivesse respondido da forma e
ao tempo que ele esperava, talvez estivesse desanimado, até mesmo decepcionado
com Deus. Ao que tudo indica a preocupação de Paulo com seu filho adotivo, era
de que ele estivesse entrando ou mesmo já se encontrasse num estado depressivo.
Por isso o apóstolo Paulo recomenda-lhe que sejam quais forem as
circunstâncias, que ele não se esquecesse de que o Espírito santo habitava
nele.
O que está acontecendo conosco?
Por que permitimos que o dom se apague?
Por que nos esquecemos de que o Espírito Santo habita em nós?
Podemos oferecer algumas respostas para estas inquietantes perguntas:
As pressões da vida
A vida não têm sido fácil para
ninguém, contudo, três categorias têm sido sobremaneira sacrificadas: os pobres, os da classe média e os
jovens.
Os pobres sofrem com a
precariedade dos serviços públicos essenciais: saúde, educação, segurança, sem
contar com as crônicas dificuldades de moradia e alimentação.
A classe média com seus
salários congelados perde gradativamente seu poder de compra (bens e serviços)
diante de preços que não param de subir.
As maiores vítimas – e isso tem a ver com Timóteo – são os adolescentes e os jovens. Ter um
mundo para conquistar, mas, sem emprego, como fazê-lo?
Quando se consegue um estágio remunerado, algo que deveria ser
absolutamente normal dói a consciência saber que centenas (que precisavam tanto
quanto), ficaram de fora. Para muitos a única solução aparente é deixar o país.
É nessas condições que somos chamados a testemunhar acerca do poder de
nosso Senhor (vers. 8). Nós, que estamos precisando de alento, é que temo de
confortar os outros. Nós, que queríamos ver esse poder, é que temos de falar
dele. É daí que surge parte de nosso desânimo, especialmente quando vemos o que
o salmista viu: a prosperidade do ímpio (Salmo 37). E como dói ver o incrédulo
prosperar!
Outras pressões vão além do plano material: guarda do sábado, assédio
moral, questões ligadas à pureza – tais como castidade.
A pressão é muito grande e, às vezes apaga o dom, não somente dos
adolescentes e jovens, mas também dos solteiros e solteiras que querem
constituir família; dos viúvos e das viúvas que não querem ficar sozinhos; aos
separados e separadas que querem recompor suas vidas afetivas.
A solidão dói, machuca, abafa e abala.
Os sofrimentos da vida
Nosso dom se apaga quando provamos aquilo que consideramos o silêncio de
Deus. Em outras palavras, quando oramos a Deus e não ouvimos a resposta.
Aprendemos que Deus tem o Seu tempo e isso nos consola por algum tempo. Oramos,
oramos, tornamos a orar e nada de resposta. Depois, nos cansamos de esperar.
Evidentemente sabemos que devemos orar pelo nosso filho afastado da
igreja e de Deus, mas por quanto tempo?
Temos consciência de que precisamos orar pela saúde das pessoas
queridas, mas até a quando? Oramos pela saúde das pessoas e elas acabam
morrendo. Oramos pela recuperação das pessoas e elas continuam sofrendo. Isso
nos deixa cansados e debilitados. Afinal, nossa fé é para todas as áreas de
nossa vida. Deus não é só para a vida religiosa, mas para a vida toda.
A pergunta que não quer calar é: vale a pena servir a um Deus deste?
Paulo, que sofria a prisão, como que para testar seu filho na fé, faz-lhe um
convite: vem sofrer comigo, Timóteo (vers. 8).
O cansaço da igreja
Coisas que por vezes sobram na igreja: línguas para criticar
destrutivamente; dedos para apontar os erros dos outros; olhos para ver as
brechas; ligeiras pernas para se esquivar dos compromissos; cérebro para
discutir temas irrelevantes. Como perdemos tempo com coisas sem importância!
Enfim, em dados momentos, na igreja sobram palavras, palavras de
compreensão e entendimento.
Lamentável e infelizmente, por outro lado, faltam: braços para fazer o
que precisa ser feito; ombros para sustentar os que querem ficar firmes;
disposição para tapar, ainda que seja apenas uma brecha (Ezequiel 22:30); vigor
para se por a caminho; inteligência e criatividade para encontrar soluções
novas para um novo tempo que têm as carências de sempre.
Igualmente enfim, na igreja faltam ações, ações de compreensão e
entendimento.
Por todas as razões aqui apresentadas e por outras mais é que há muita
gente cansada de igreja e que logo se cansará também de Deus, que logo se afastará
de Deus, às vezes irremediavelmente.
“Há gente cansada porque fez muito
e acabou sufocada pela incompreensão e pela crítica. Há gente cansada por não
ter feito nada. Há gente que se cansa de sua própria acomodação. Há gente
cansada de esperar atitudes coerentes”.
O cansaço de Deus
Dificilmente ou raramente alguém confessará tal coisa, entretanto é fato
que pessoas se cansam de Deus porque o acesso a Ele é fácil demais.
Para qualquer um de nós Ele está disponível durante 24 horas por dia.
Não há qualquer exigência para se falar com Ele. Também não existe um local
específico para se falar com Ele. Igualmente não existe uma posição para se
falar com Ele.
Banalizamos Deus pelo fato dele ser
gracioso demais! Que tremendo paradoxo, como se preferíssemos um deus aterrador
e pavoroso, do tipo mitológico; irado que necessita ser aplacado. Não se trata
de uma situação vivenciada apenas por pessoas convertidas em idade adulta, mas
também aqueles que são cristãos de berço. Há gente esquecida de sua salvação e
de sua santa vocação (vers. 9).
Conclusão
Há muita gente triste com a sua salvação, por mais estranho que isto
possa parecer. Se somos salvos e estamos cansados, é porque nos esquecemos que
somos salvos (Isaías 40:31) ou porque a salvação produz tristeza em nós
– isso é atípico.
“Torna a dar-me a alegria da tua
salvação, e sustém-me com um espírito voluntário” (Salmos
51:12).
Para o salmista, falta a muitos a alegria da salvação, alegria que produza uma
adoração vibrante, alegria que produz uma vida ativa, fruto do Espírito Santo
que em nós habita.
Que a preocupação demonstrada pelo apóstolo Paulo por seu filho na fé –
Timóteo, não venha a concretizar-se em sua vida, na minha vida, em nossas
vidas.
É o meu desejo e a minha oração. Amém!!!
©
Nelson Teixeira Santos
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