TEIMOSIA, UMA VIRTUDE RARA

 

 “Assim, deixei que andassem na teimosia do seu coração, e seguissem as suas próprias inclinações” (Salmos 81:12 – NAA).

 

           Introdução.

           Quase sempre quando se ouve, se pensa ou se pronuncia a palavra teimosia, ela vem acompanhada de uma conotação negativa, remetendo-nos a um defeito moral, uma falha de caráter, inclusive nas Santas Escrituras; contudo, nem toda teimosia é maléfica e eticamente incorreta.

 

            Objetivo da mensagem

            Mostrar que sendo essencial nas questões espirituais, essa modalidade de teimosia, é na verdade, uma virtude rara.

 

            Etimologia da palavra

            Dicionários a definem como: substantivo feminino, que tem a ver com apego obstinado às próprias ideias, gostos etc.; podendo significar também: obstinação, perseverança, persistência, insistência, pertinácia exagerada e relutância. Também é considerada uma característica ou comportamento da pessoa teimosa, obstinada, que não desiste facilmente; que teima.

            Tão rara como virtude, é a sua aparição, de forma escrita, nas Páginas Sagradas. Ocorre uma única vez (o texto chave – Salmos 81:12) nas versões (Almeida Revista e Atualizada; Nova Almeida Atualizada). Outras versões bíblicas fazem uso da palavra obstinação. É encontrada em versões mais modernas como na NTLH, NVT, NBV, etc.

            Como já foi dito, toda vez que a palavra teimosia, dura cerviz, obstinação ou suas correlatas, aparecem no texto bíblico, elas tem a ver com a insistência num mau propósito _1; por exemplo, em Salmos 64:5: “Teimam no mau propósito; falam em secretamente armar ciladas; dizem: Quem nos verá?” (Salmos 64:5 – ARA).  Outras aparições na Bíblia: Deuteronômio 31:27; Atos 7:51; I Samuel 15:23; Ezequiel 3:7.   

            Mas acreditem, existe a teimosia santa, ou seja, aquela que insiste em acreditar em Deus em toda e qualquer circunstância. Isso é fé!

           Não existe vitória maior do que superar pela fé uma dificuldade qualquer, de pequena ou grande monta, de curta ou longa duração, até que se enxergue a luz no fim do túnel!

 

            O “x” da questão

            Se toda vez que é mencionada nas Santas Escrituras ela traz consigo uma conotação negativa, surge a pergunta: Onde encontrá-la, na Bíblia, de forma positiva?

            Sabe aquela velha história que compara a Bíblia a uma mina de tesouros?

            As preciosas gemas, as jazidas dificilmente são encontradas na superfície!

            O que é preciso para se chegar até elas?   Cavar fundo. Em outras palavras, não é com uma leitura superficial que vamos chegar até elas. Difícil, mas não impossível!’

            

           Bons exemplos bíblicos.
           Veja-se, por exemplo, a teimosia do profeta Habacuque, registrada naquele que é considerado um salmo magnífico de louvor e oração: “Ainda que as figueiras não produzam frutas, e as parreiras não deem uvas; ainda que não haja azeitonas para apanhar nem trigo para colher; ainda que não haja mais ovelhas nos campos nem gado nos currais, mesmo assim eu darei graças ao Deus Eterno e louvarei a Deus, o meu Senhor” (Habacuque 3:17-18, BLH).
           Veja-se também a conhecida e magistral teimosia do salmista: “Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo; o teu bordão e o teu cajado me consolam” (Sl 23:4).
           A expressão ainda que ou ainda quando, usada por Habacuque e por Davi, é muito enfática. Ela quer dizer que mesmo havendo alguma tragédia, grande ou pequena, isso não pode nem deve perturbar a paz daquele que está firmado no Senhor. O profeta Habacuque conclui afirmando: “O justo viverá pela sua fé” (Hc 2:4) ₂.

 

           Os limites do possuidor dessa santa teimosia.
           Todo aquele que é agraciado por essa santa teimosia é capaz de adorar a Deus nos momentos humanamente menos improváveis.

            Depois de perder todos os seus bens, seus dez filhos e ser abandonado pela esposa, inconformada com aquela situação desoladora, “Jó se levantou, rasgou o seu manto, rapou a cabeça e lançou-se em terra e adorou; e disse: Nu saí do ventre de minha mãe e nu voltarei; o Senhor o deu e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor!” (Jó 1:20-21).

           A teimosia do homem da terra de Uz (Jó) era devida à sua certeza: “Eu sei que o meu Redentor vive e por fim se levantará sobre a terra” (Jó 19:25). Seu limite está escrito de forma inequívoca: “Ainda que ele me mate, nele esperarei” (Jó 13:15 – ACF).

                      O rei Davi comportou-se da mesma maneira: depois da morte do filho, fruto do adultério com Bate-Seba ele “se levantou da terra, lavou-se, ungiu-se, mudou de vestes, entrou na Casa do Senhor e adorou” (II Sm 12:20).

             O evangelho de Lucas no capítulo 18, vers. 1 a 8, é o único a relatar a parábola do juiz iníquo, contada por Jesus, que nada mais é do que a história de uma viúva teimosa que queria ter sua causa julgada contra o seu adversário.

            Mateus 20:29-34; Marcos 10:46-52 e Lucas 18:35-43 compartilham uma história que seria cômica, se não fosse trágica, da cura do teimoso cego de Jericó por Jesus.

            A biografia do também teimoso apóstolo Paulo, após sua conversão, dispensa qualquer comentário e isso o levou a afirmar com toda convicção, já próximo do final da vida: “Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé” (2 Timóteo 4:7 – ARA).

            E o que dizer do próprio Cristo:

            “Porque o Filho do homem veio buscar e salvar o que se havia perdido” (Lucas 19:10 – ACF).

            “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam” (João 1:11 – NAA).

             “Não pensem que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, mas para cumprir“ (Mateus 5:17 – NAA).

            “A minha comida consiste em fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (João 4:34 – NAA).

            “Meu Pai, se não é possível que este cálice passe de mim sem que eu o beba, faça-se a tua vontade” (Mateus 26:42 – NAA).

     

            A lição a ser aprendida

            Num mundo corrompido e dominado pelo pecado onde o desrespeito, a violência, a imoralidade e a irreverência imperam, a Palavra de DEUS nos convida a avançar, às vezes parar, ceder ou recuar; a corrigir, a traçar e a buscar novas rotas; aprender, desaprender, tornar a aprender, rever conceitos. O crescimento espiritual requer isso.

            Caminhar pelas veredas de justiça exige determinação, ousadia, coragem, persistência e por que não uma dose exagerada dessa teimosia santa!

 

           Conclusão.
           Há certas situações na vida por demais complicadas pelas quais só conseguiremos superá-las de cabeça erguida, olhando para o alto, ou seja, se formos realmente teimosos na fé. Convenhamos, ser cristão atualmente requer uma boa dose de teimosia, no bom sentido é claro, pois você está na contramão do mundo na forma de ver e sentir as coisas. Na forma de viver, de relacionar-se com o mundo, com outras pessoas dentro e fora da igreja, de trabalhar, de recrear, de se vestir, falar, comer, beber, de adorar!

            O recado para igreja, hoje mais do que nunca é: “Segui a paz com todos, e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hebreus 12:14 – ACF).

            Correr atrás de algo bom, que durará para sempre, ainda vivendo num mundo mal, não é tarefa fácil. Isso exige uma boa dose de teimosia; teimosia boa!

           É como explica o salmista: “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente nas tribulações. Portanto, não temeremos ainda que a terra se transtorne e os montes se abalem no seio dos mares; ainda que as águas tumultuem e espumejem e na sua fúria os montes se estremeçam” (Sl 46:1-3).

            É o meu desejo e a minha oração. Amém!!!

 

 

 

Referências Bibliográficas:

 

1  Pequena Enciclopédia Bíblica O. S. Boyer_, página 597, Editora Vida, 1997.

 

2  O livro de Habacuque apresenta a questão da prosperidade dos ímpios. Neste contexto, quando DEUS responde e repreende Seu povo de forma mais severa, surge outro problema: por que DEUS se utiliza dos caldeus, um povo mais iníquo do que os próprios judeus, para “castigá-los”? A resposta divina é dada em uma só incisiva declaração, “O justo viverá pela sua fé”. Isto é, por mais desesperadora que seja a situação, ou por mais grandiosa que seja a vitória, o filho de Deus não deve julgar pelo que parece, mas pela Palavra de Deus – pelo “assim diz o Senhor”.

 

 

 

 

© Nelson Teixeira Santos