"todos
os que estiverem nele são declarados justos por meio dele..."
Tenho que
confessar que 2 Pedro 2.7 sempre me deixa perplexo. Quando você lê Gênesis 19 e
a descrição do julgamento de Deus sobre Sodoma e Gomorra, não há muito que te
leve a pensar que “Ló, homem justo” “se afligia com procedimento libertino dos
que não tinham princípios morais”, conforme relata Pedro.
Em Gênesis 19, Ló está vivendo em
Sodoma com, aparentemente, nenhuma dificuldade para dormir a noite. Como muitos
comentaristas afirmam, ele estava sentado no portão da cidade (Gn 19.1), o que
indica que indica que ele tinha alguma influencia na cidade. Embora não haja
nada de errado em ter certa influência em uma cidade repleta de pecadores (de
fato, deveríamos almejar mais isso hoje em dia), nada no texto indica que Ló
estava trabalhando para transformar a cidade para o Reino de Deus.
Além disso, enquanto ele insistia
em mostrar hospitalidade aos estrangeiros que estavam visitando, ele também
oferece suas filhas virgens, no lugar das demandas lascivas dos seus vizinhos
em dormir com estrangeiros. Além disso, as filhas de Ló o embebedaram para que
ele fosse pai dos seus netos na ultima parte do capítulo. Não acho que podemos
varrer isso facilmente para debaixo do tapete. Então, pelo menos em Gênesis 19,
as evidências certamente vão de encontro à imagem de Ló como justo. Então, como
Pedro pode chamá-lo de “Ló, homem justo”?
Eu acho que a chave desse enigma
é encontrada em Gênesis 19.29: “Quando Deus arrasou as cidades da planície,
lembrou-se de Abraão e tirou Ló do meio da catástrofe que destruiu as cidades
onde Ló vivia.”
Quando ligamos os pontos,
descobrimos que Ló era justo por causa do Evangelho. Em Gênesis 15.6, nós vemos
que Abraão acreditava em Deus e isso lhe foi imputado como justiça. Com isso
dizemos que Abraão foi justificado pela fé e, como podemos ver em Gênesis
12-17, a aliança abraâmica é um testemunho da justificação pela fé. Paulo
parece sobre isso em Romanos 4 e Gálatas 3.
Então, quando Gênesis 19.29 diz
“Deus se lembrou de Abraão”, eu acho que podemos ter uma pista de como Ló era
de fato justo. Eu não acho que podemos dizer que quando Deus se lembrou de
Abraão, a justiça através da fé de Abraão foi imputada a Ló. Antes, a lembrança
de Deus a Abraão se refere a, pelo menos, duas coisas: primeiro, Abraão era de
fato justo pela fé, e encontrou favor diante de Deus. Por causa disso, o
resgate de Ló foi, de certa forma, em benefício de Abraão. Foi, claramente, uma
resposta às orações de Abraão em Gênesis 18.22-23.
Mas isso ainda não explica 2
Pedro 2.7. De fato, Pedro vai dizer que Ló era atormentado “pois, vivendo entre
eles, todos os dias aquele justo se atormentava em sua alma justa por causa das
maldades que via e ouvia” (2 Pedro 2.8). Então, com base em 2 Pedro, nós
devemos concluir que há mais do que um simples favor de Deus a Abraão em
Gênesis 19. Eu creio que quando Deus se lembra de Abraão, ele não estava apenas
se lembrando de Abraão individualmente. Assim, a segunda maneira pela qual Deus
se lembra de Abraão, foi pela aliança que tinha com Abraão e a promessa de que,
como Paulo coloca, todas as pessoas de fé são filhos de Abraão (Gálatas 3.9).
Então como Ló era justo? Ló era
justo da mesma forma que você e eu somos justos – crendo no Deus de Abraão.
Deus de se lembra de Abraão (Gn. 19.29), cuja fé lhe foi imputada como justiça
(Gn 15.6). A única resposta biblicamente consistente que responde a pergunta de
como Ló era justo (2 Pe 2.7) é que ele, como Abraão, cria em Deus. Ló era justo
não porque ele agiu perfeitamente no incidente com os estrangeiros em Gênesis
19 – longe disso. Mas sabemos por Pedro que ele foi perturbado pelo pecado que
ele via ao seu redor dia após dia.
Sugiro que o que nós devemos
fazer é ler a Bíblia canonicamente nessa situação. Nós podemos ver em Gênesis
19.29 que a fidelidade de Deus para com a sua aliança com Abraão foi um fator
decisivo no resgate de Ló. Nós sabemos que, de acordo com Gênesis 15.6, Deus
justifica, ou faz justo, aquele que crê nas suas promessas. Então, podemos
inferir o estado de justiça de Ló em Gênesis. Como consequência disso, podemos
supor que, assim como a obediência de Abraão no sacrifício de Isaque em Gênesis
22 foi resultado desse estado de justiça, a justiça de Ló deve conduzir à
obediência. Gênesis nos deixa imaginando como isso poderia ter acontecido.
Mas 2 Pedro 2 confirma que Ló
também era justo e como esse estado de justiça o afetou. Ele estava atormentado
pelo pecado que via a sua volta em Sodoma. Contudo, essa não foi a causa de sua
justiça, mas sim o resultado dela. Tanto a justiça dele quanto a nossa, como 2
Pedro 1.1 nos lembra, é final e totalmente baseada na justiça de nosso Deus e
Salvador Jesus Cristo.
Isso significa que o único
caminho para afirmar tanto os relatos de Gênesis 19 como o ensinamento de 2
Pedro 2 é ler os dois em harmonia. E quando nós lemos esses textos
canonicamente e Cristologicamente, as peças se encaixam de uma forma que só
podemos chegar a uma conclusão: Ló era simultaneamente justo e pecador.
E, mais frequentemente do que
gostaria de admitir, eu ajo como Ló agiu. Eu também fico perturbado com o
pecado que vejo à minha volta no mundo. Mas muito frequentemente, eu acabo
respondendo ao pecado que vejo a minha volta da mesma forma como Ló fez –
pecando. Meu palpite é que muitos cristãos também compartilham dessa mesma
experiência.
Mas como Ló, eu também fui
declarado justo. Não pelo que eu tenha feito, mas pelo que Cristo fez por mim.
E no fim dos dias, serei proclamado como justo pela união com o Único
verdadeiramente Justo. Nenhuma pessoa é declarada justa se estiver separada de
Cristo, mas todos os que estiverem nele são declarados justos por meio dele. E
foi por isso que Ló pôde ser declarado como justo mesmo em meio aos seus
pecados. Então, 2 Pedro 2.7 é uma prova da audácia do evangelho – Pedro pôde
chamar um homem com muitas falhas óbvias de “Ló, homem justo” por causa da
promessa a Abraão. E se nós estamos em Cristo, então Deus também nos salvou
porque Ele se lembra da sua promessa a Abraão.
Chris Bruno (PhD, Wheaton College) serves with Antioch School Hawaii and
Harbor Church in Honolulu, Hawaii. He and his wife, Katie, have
three sons and the scars to prove it
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