Ministério Pastoral Feminino em debate (I)
Após participar de
vários debates sobre a autenticidade e
biblicidade do ministério feminino, em especial no que tange
à ascensão da mulher ao ministério pastoral, resolvi escrever sobre o assunto.
Ainda que eu entenda que, no atual momento histórico da Igreja,
este tipo de discussão não devesse mais ser alvo de nossa
atenção, lamentavelmente, ainda encontramos,
entre os setores evangélicos mais conservadores, uma
enorme dificuldade na aceitação do ministério pastoral feminino.
Devido a isso, sinto-me impulsionado a escrever sobre o assunto.
I) - Deus comissionou tanto o homem quanto a mulher.
Ao lermos o relato do
livro de Gênesis, percebemos que Deus não somente comissionou o homem.
Está claro no texto que Deus delegou tanto ao homem quanto à
mulher, ambos criados a sua imagem e semelhança (cf. 1:27),
uma missão. Disse-lhes Deus: “Sede fecundos, multiplicai-vos,
enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves
dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra”. (1:27).
Isso significa afirmar que
tanto a mulher quanto o homem estão em igualdade de
direito e honra diante de Deus. São filhos queridos do
grande criador de toda a terra. Ele, que tem o domínio pleno, foi
quem estabeleceu que tanto a mulher quanto o homem exercessem
domínio sobre a terra. Um domínio que não fosse tirano ou
subjugador das espécies que habitavam sobre a
face da terra. Ao contrário, somos chamados para
exercer uma missão de protetores, de
cuidadores da obra de Deus.
Se ambos têm a
imagem e semelhança de Deus, e são por Ele comissionados, ambos
estão aptos para servirem a Deus com integridade e totalidade.
II) - O ministério pastoral é para aqueles/as que são chamados/as por Deus.
A ideia errônea de
que Deus separou o ministério pastoral somente para o homem
parte de uma concepção equivocada sobre o papel e o
valor da mulher perante Deus. Essa concepção parte do
princípio de que a mulher, por ser auxiliadora
do homem (cf. Gn 2:18), não tem direito ou
condições de ministrar como pastora diante de
Deus. Essa é uma postura pequena acerca da obra
divina, uma postura que não consegue perceber em
Deus um ser que ultrapassa nossos
perecíveis conceitos e paradigmas controversos.
Deus não está
sujeito às minhas convenções. Ele é quem é o Senhor de toda a natureza,
toda a terra e universo. Ele tem poder para estabelecer e derrubar
reinos. Ele tem poder para conceder autoridade tanto às
mulheres quanto aos homens.
O ministério
pastoral é concedido pelo Espírito Santo, àqueles/as que Ele
mesmo separou. Então, devo entender o ministério pastoral como um
dom que é concedido pelo Espírito Santo que, segundo o
apóstolo Paulo, concede dons àqueles/as a quem Ele
quer. Ele, o Espírito Santo, é livre e soberano sobre a
Igreja.
III) - O ministério pastoral é um dom concedido pelo Espírito Santo.
O texto de 1Cor 12:1-11 nos ensina
que “há diversidade nos serviços, mas o Senhor é o mesmo”.
Afirma, também, que “Deus é quem opera tudo em todos”.
Se entendermos o ministério
pastoral como um dom, um serviço concedido pelo
Espírito Santo à Igreja, percebemos que Deus, segundo o
seu Espírito, pode concedê-lo tanto aos
homens quanto às mulheres. Pois, segundo o mesmo texto
relatado acima, “a manifestação do Espírito é
concedida a cada um, visando a um fim, um proveito”. O
texto ainda afirma que: “mas um só e o mesmo Espírito realiza todas
estas coisas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um
individualmente”.
Precisamos estar atentos
ao texto do apóstolo Paulo, escrito aos romanos, quando
ele nos ensina que fazemos parte de
um só corpo, e somos um mesmo corpo
Vejamos o texto
na íntegra:
“Porque pela
graça que me foi dada, digo a cada um
dentre vós que não pense de si mesmo além do que
convém; antes, pense com moderação, segundo a
medida da fé que Deus repartiu a cada um.
Porque assim como, num só corpo, temos muitos
membros, mas nem todos os membros têm a mesma função, assim, também nós,
conquanto muitos, somos um só corpo em Cristo, e membros uns
dos outros, tendo, porém, diferentes dons, segundo a
graça que nos foi dada: se profecia, seja segundo a
proporção da fé; se ministérios (aqui se incluem todos os
serviços prestados na obra de Deus, inclusive o ministério pastoral),
dediquemo-nos ao ministério; ou o que ensina [...]; o que preside,
com diligência; quem exerce misericórdia, com alegria.” (Rm 12:3-8).
Aprendemos que os dons são
concedidos pelo Espírito Santo à Igreja, levando-se em consideração a
soberana vontade de Deus e as necessidades do corpo de
Cristo. Ora, os dons
não são concedidos, levando em consideração o gênero
masculino ou feminino, mas, sim, a vontade de Deus e as
necessidades da Igreja. Sendo assim, não há nenhum impedimento que uma
mulher receba o dom do ministério pastoral, dom de serviço, dom de
presidência.
Se acreditarmos que há
impedimento por parte de Deus em conceder alguns dons aos
homens e outros distintos às mulheres, ou que somente concede dons
para homens ou para mulheres, estaríamos afirmando,
indiretamente, que Deus faz acepção de pessoas, fato
que não é verdadeiro. Deus concede dons à sua Igreja, para sua honra
e glória.
Os opositores
do ministério pastoral feminino usam, dentre outros, o
argumento de que nos textos do Novo Testamento, em nenhum momento,
é usado o substantivo feminino em relação ao ministério
pastoral. E, devido a isso, os mesmos afirmam que
não há base bíblica para o ministério pastoral feminino na Igreja.
Ora, todos sabemos que a língua grega, língua usada na
elaboração dos textos paulinos e outros, assim como a
língua portuguesa, são línguas que dão
preferência ao uso do gênero masculino. Sendo assim,
raramente encontraríamos nos textos o uso da expressão
pastora em detrimento da expressão pastor; a expressão mestra
em detrimento de mestre; ou diaconisa como preferência
ao uso da expressão diácono.
Porém, a ausência de expressões do gênero feminino
para designar pastoras ou profetisas nas cartas de Paulo não pode ser
visto como um impedimento para que a Igreja
atual, que vive em uma outra circunstância histórica, onde a
mulher, sua importância, capacidade e vocação são destacadas,
não consagre pastoras ou episcopisas. Entendo que Deus não
faz distinção de gênero. Ele não fez uma aliança somente com
os homens (varões), mas com todas as pessoas que
vieram até Ele por intermédio de Jesus Cristo.
Os opositores
do ministério feminino deveriam usar o mesmo critério para
negar a possibilidade de ascensão das mulheres no
exercício de outras funções na Igreja, visto que também não encontramos
no Novo Testamento termos como: professora de Escola de
Dominical, Diaconisa, Profetisa (não encontrados nas cartas
pastorais), cantoras, mulheres dirigentes de corais, de
congregações, missionárias mulheres evangelistas, etc.
Vale destacar que, na
época em que os textos bíblicos foram escritos, não se tinha noção de
linguagem inclusiva ou de uma linguagem de cunho não sexista.
A oposição ao ministério
pastoral feminino é mais percebida entre os pentecostais clássicos e
evangélicos tradicionalistas. Por que estes grupos não se opõem ao fato
de que mulheres são batizadas com o Espírito Santo, em suas
reuniões (falo dos grupos pentecostais), visto que também a Bíblia
não relata nenhum episódio dessa natureza relacionado
diretamente ao sexo feminino? Por que não se opor ao fato das
mulheres terem o dom de variedade de línguas, visto que
também o texto bíblico quando fala deste importante dom
e outros (cf. 1 Co 12:8-11) usa uma expressão que está no masculino e não
no feminino? Ex: a outro, no mesmo Espírito, dons de curas [...] a
um, variedade de línguas, etc.
Repito, o fato
de não encontrarmos a expressão pastora no texto
bíblico do Novo Testamento não consiste num impedimento para
a consagração de mulheres ao ministério pastoral. Se Deus as chamou e as
capacitou, quem somos nós para nos opormos à vontade soberana de
Deus, visto que não há nenhum texto bíblico que proíba a consagração de
mulheres ao ministério pastoral.
Um outro fator que
deve ser levado em conta, quando lemos os textos bíblicos, está
relacionado com o momento histórico
Logo, não há
nenhuma base bíblica para negar a autenticidade do ministério
pastoral feminino. Como já afirmei acima, o Espírito
Santo concede dons às pessoas como lhe apraz.!
A Igreja é
chamada para romper com as tradições que tanto impediram os
fariseus e saduceus de entender a revelação de Deus através
de Cristo. Deus chama homens e mulheres para o seu serviço na
seara santa, sem distinção de cor, sexo, ou nacionalidade.
V) - A Bíblia destaca várias
mulheres que foram usadas poderosamente por Deus.
Ao lermos a Bíblia,
percebemos inúmeros textos que relatam o importante
trabalho desempenhado por mulheres em vários
momentos históricos experimentados tanto por Israel quanto
pela Igreja do Senhor. Várias mulheres desenvolveram o pastoreio
tanto em Israel quanto na Igreja. Mulheres que aconselhavam, que
visitavam, que oravam, que cuidavam dos crentes,
que presidiam igrejas em suas casas, etc. Pastorear é cuidar,
zelar, visitar, discipular, acompanhar, é ministrar os sacramentos, é
batizar, e isso, algumas mulheres fazem melhor que alguns pastores.
A Bíblia enumera
nomes de algumas mulheres consideradas notáveis na história tanto
de Israel quanto da Igreja. Em se tratando da história da Igreja, encontramos
dezenas de testemunhos que destacam que várias mulheres desempenharam
importante papel quanto ao desenvolvimento, edificação e pastoreio
da Igreja do Senhor.
Dentre os testemunhos bíblicos
sobre o importante trabalho desenvolvidos pelas mulheres, tanto em Israel
quanto na Igreja, destacamos:
a) - Débora: Juíza – profetisa - conselheira e pastora de Israel (cf. Jz
4.4);
b) - Ana: profetisa (cf. Lc 3:36);
c) - Hulda: profetisa (cf. Rs 22:14);
d) - Noadia: profetisa (cf. Rs 22:14);
e) - Filhas de Filipe: profetisas (cf. At 22:9);
f ) - Rute – ascendente de Jesus Cristo – moabita – (cf. livro de Rute);
g) - Júnia – Considerada apóstola pela tradição da Igreja (cf. Rm 16:7 );
h) - Miriam: Profetisa (cf. Ex 15:20);
i ) - Febe: obreira da Igreja, considerado como nobre em talento e honra (cf.
Rm 16:1-2);
j ) - Priscila: obreira da Igreja que dirigia uma igreja que se reunia em
sua casa – missionária – discipuladora de Apolo (cf. At 18:26; Rm 16:3);
k) - Lídia – abrigava uma igreja em sua casa;
l ) - A samaritana: mulher evangelista (cf. Jo 4:29);
m) - Maria, mãe de Jesus, mulher que acompanhou o surgimento da Igreja e estava
presente na primeira reunião de oração de seu estabelecimento, e
que exerceu influente ministério junto à comunidade nascente(cf. At 1:14);
Conclusão:
Para concluir
este brevíssimo ensaio, repasso aos/às leitores/as, e, em especial, aos
opositores ao ministério pastoral feminino, a pergunta motivadora
que perpassa todo o texto: Por qual razão Deus
não delegaria às mulheres este importante ministério, o
ministério pastoral?
O reverendo Marco Antonio de Oliveira é
Pastor titular da catedral Metodista do Rio de Janeiro, conferencista,
terapeuta de família, psicanalista clínico, especialista e doutorando em
Teologia.
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